27/02/15

Blind Light

12.
em 1999 vi uma exposição no centro cultural hélio oiticica
lembro da luz que fazia naquela tarde
lembro da luz que entrava por uma janela no segundo andar
e transformava a sala de
exposição
lembro dos mapas atravessando toda a sala
os mapas espalhados sobre colchões
um colchão ao lado do outro colchão
lembro de sair de lá
e caminhar pelo centro do rio
rua luís de camões avenida passos
lembro da luz que fazia naquela tarde
blind light

13.
entrar no espaço interior equivale a sair?

14.
de que maneira uma tradução
quando entra na língua de chegada
pode deslocar o corpo do que sescreve ali
e refazer a roda de leitura e produção?
de que maneira um poeta escrevendo na mesma língua
como é o caso da adília lopes
pode entrar no corpo da literatura
e ser lido como tradução?


[ Marília Garcia, in "Um Teste de Resistores", Ed. Mariposa Azual]

Marília Garcia

1979

24/02/15

Melancolia - Um Fragmento

Encostada à parede mais larga de um convento que se abatia,
Onde ruinosas heras amparavam a escarpa das ruínas -
De braços cruzados envolvendo a sua mortalha esfarrapada,
A melancolia fizera-a meditar até adormecer.
Os fetos comprimiam-se debaixo do seu cabelo,
A língua verde-escura da serpente ali se encontrava;
E silenciosamente como passara lânguida e serena brisa do mar,
Agitando-se, a folhagem longa e delgada curvou-se sobre o seu rosto.

O rosto pálido enrubesceu: o seu olhar impaciente
Resplandeceu eloquente em sono! Intimamente elaborados,
Sons imperfeitos os seus lábios movendo-se abandonaram,
E a sua fronte inclinada ocupou-se de agitado pensamento.
Estranho era o sonho - 


[ Trad: Cecília Rego Pinheiro , in "Rosa do Mundo", Ed. Assírio & Alvim ]

Samuel Taylor Coleridge

1772 - 1834

06/02/15

"Passagens, Mudanças De Voz"


A Primeira Manhã

O crepúsculo da manhã nascente sopra o esbraseamento
ténue e branco
em voo na linha do horizonte.
E por sobre límpidas
palidíssimas as luzes urbanas, acendem os espelhos
das salinas: quatro águas que estremecem  a manhã.
Por trás da casa atrás de nós o húmido marulho
de pássaros frágeis que destecem a sombra.
A teu lado o corpo de quem te convida
à manhã do mundo.

Manuel Gusmão

1945